Não é novidade transformar uma sequência em uma versão “maior e melhor” do original, e essa abordagem serve como ponto de partida para a produção. Enquanto Homem-Aranha no Multiverso (2018) mostrou o “multiverso-aranha” cruzando o caminho de Miles Morales, agora é a vez do jovem explorar outros universos enquanto enfrenta o inusitado vilão Mancha em seu próprio mundo.
O roteiro inteligente de Phil Lord, Christopher Miller e Dave Callaham reconhece a empolgação gerada pela possibilidade de explorar realidades paralelas e a aproveita em benefício da história que pretendem contar. Cada novo mundo visitado no filme transforma a narrativa, aproveitando ao máximo as diferentes localidades tanto visualmente quanto no desenvolvimento da trama.
Esses novos locais contribuem para a história ao apresentar situações que ajudam a compreender o Multiverso-Aranha, suas regras e ameaças. A estrutura que conecta essas realidades é revelada aos heróis e ao público na prática, por meio de resgates, confrontos e outras situações. Ao mesmo tempo, são introduzidos novos seres-aranha que divertem ao destacar diferenças e semelhanças com o que já conhecemos, desde piadas até elementos-chave da trama.
A história também é construída de forma que cada novo mundo seja visualmente deslumbrante, o que é apreciado tempo suficiente para deixar uma marca nos espectadores. Não é exagero dizer que a equipe de animação criou cenários igualmente interessantes e distintos em relação à Nova York de Miles que conhecemos no primeiro filme. Seja em versões mais próximas, como o universo de Gwen Stacy, onde o uso das cores predomina, ou em ambientes mais diferentes, como a combinação entre Manhattan e Mumbai no mundo do Homem-Aranha Indiano e o paraíso futurista do Homem-Aranha 2099.
Essa jornada por novos universos não é o único aspecto em que No Multiverso se expande em relação ao original. O novo filme não esquece que o sucesso do primeiro ocorreu graças ao equilíbrio entre os desafios enfrentados por Miles Morales com e sem a máscara, e continua explorando essa faceta da história. Consciente de que o amadurecimento é um processo gradual, a produção leva adiante os conflitos internos do protagonista.
A busca por uma identidade própria, as dificuldades em lidar com as expectativas dos pais e os próprios sonhos continuam sendo focos importantes. Esses conflitos humanizam Miles e os demais personagens, refletindo em suas ações como Homem-Aranha. Afinal, já passou da hora de o cinema explorar mais a essência do personagem, além do consagrado lema de “com grandes poderes vêm grandes responsabilidades”.
Nesse sentido, o filme também dá um espaço merecido para Gwen Stacy. A personagem recebe mais atenção em um arco próprio que finalmente aborda seus traumas, desejos e ansiedades, tornando-se um dos pilares de No Multiverso. Além de dar a devida importância à heroína, essa abordagem traz novas perspectivas à jornada e acrescenta camadas à dinâmica com Miles, que já havia sido estabelecida como um sucesso anteriormente.
Conforme o filme se desenrola, a dupla se torna a base para a nova história, levando-a adiante e entrando em contato com os novos Homens/Mulheres/Animais/Objetos-Aranha. Os Guerreiros da Teia – como são chamadas as versões alternativas do Homem-Aranha nos quadrinhos – trazem uma variedade bem-vinda à trama e ampliam o papel desempenhado anteriormente por Noir, Peni Parker e Porco-Aranha.
Se antes as variações serviam para mostrar que o heroísmo aracnídeo pode se manifestar de diferentes formas, as novas variações levam esse conceito adiante, mostrando como a ideia de heroísmo pode variar de pessoa para pessoa. É assim que o Homem-Aranha 2099 se torna um personagem tão importante para a produção.
Além de desempenhar um papel crucial na união dos heróis do multiverso, Miguel O’Hara traz conflitos que expandem o debate sobre o que define um Homem-Aranha. Essa abordagem agridoce, considerando as expectativas em torno de um Guerreiro da Teia, reflete bem o lado sombrio da temática abordada pela franquia No Multiverso, que enfatiza a importância de fazer escolhas.
É interessante que o filme faça todos esses esforços descritos até agora para enaltecer a jornada de Miles Morales. Embora cada personagem e seu mundo ganhem importância e sejam tratados com respeito, eles giram em torno do amadurecimento do jovem protagonista. Se o primeiro filme mostrou o jovem passando pela puberdade – de forma literal e figurativa, ao receber os poderes do Homem-Aranha – o novo filme acompanha seus primeiros passos na vida adulta.
Não é à toa que a produção, cujo destaque é uma exploração de um multiverso de super-heróis, dedica tanto tempo ao cotidiano familiar do herói. Através da singela relação com seus pais, o público é capaz de compreender as angústias, desejos e frustrações do garoto. Além disso, é possível se identificar com essas experiências, uma vez que quem assiste ao filme já passou ou passará por conflitos semelhantes. E é aí que a produção desperta o verdadeiro poder do Homem-Aranha: o fator de identificação.
Com todos esses elementos, Homem-Aranha: Através do Aranhaverso brilha ao apresentar uma nova forma de contar uma aventura universal, ao mesmo tempo que cria a experiência definitiva de um multiverso no cinema de super-heróis. A direção de Joaquim dos Santos, Kemp Powers e Justin K. Thompson conduz o filme com doses precisas de empolgação, drama e comédia, tornando a história ainda mais envolvente, impactante e surpreendente.
Não há prova maior disso do que a maneira como o filme incorpora uma infinidade de easter eggs quando Miles e Gwen exploram a Sociedade Aranha. Com homenagens capazes de deixar qualquer fã do Homem-Aranha satisfeito – seja dos quadrinhos, filmes, animações ou jogos – as referências nunca roubam o foco da história e surgem como a cereja do bolo.
Nesse sentido, também é importante destacar como o novo filme incorpora os eventos do filme anterior. Embora cada obra precise ser avaliada por seus próprios méritos e falhas, houve um esforço significativo para entrelaçar a nova história nos eventos e personagens do primeiro filme. Embora possa parecer óbvio, prestar atenção a esses detalhes e conectar viradas importantes da nova aventura aos elementos estabelecidos anteriormente valoriza a mitologia em construção e confere uma sensação de unidade a essa trilogia em que tudo se conecta de maneira natural.
Dessa forma, Homem-Aranha: Através do Aranhaverso prova que o sucesso do filme anterior não foi mera sorte. A produção atende às enormes expectativas ao seu redor, proporcionando exatamente a experiência que se esperava, mas com surpresas inesperadas. O filme dá um salto de fé em direção a novos horizontes e nos lembra que ainda há muito a ser explorado com os super-heróis.
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